Havia certa comoção em relação ao filme
Cavalo de Guerra, por muitos defenderem a
ressurreição de um dos ícones do cinema, surgido em meio à prodigiosa geração de setenta: Steven Spielberg.
Sintoma interessante que demonstra o poderio do diretor e que suscita o público a clamar pelo o ressurgimento de seu incontestável
talento. Fato este, em minha opinião, não consumado.
Há sim, lampejos de sua genialidade ao longo da projeção,
mas não mais que isso. Spielberg demonstra ter
procurado o conforto do cinema clássico dos idos
da década de 40, estruturando uma narrativa linear que não foge do lugar comum
e que falha em suas homenagens pouco convincentes. Os personagens naufragam no
pouco material que possuem para trabalhar, comunicam-se invariavelmente por meio
de frases prontas, de efeito, dignas das traseiras dos caminhões. A fotografia,
apesar de bela, por vezes mostra-se artificial e a narrativa se perde num
melodrama fácil e pedante. Até mesmo John Williams parece limitado entregando
uma trilha óbvia e descartável.
O filme tem em Jeremy Irvine, companheiro de cena do cavalo,
sua maior fraqueza. O texto choroso torna-se ainda mais superficial proferido
pelo inexpressivo rapaz. Spielberg não só errou em sua escolha como também em
dirigi-lo. Os personagens coadjuvantes são pálidos e os encontros narrativos
não adubam a história, sendo facilmente esquecidos ao longo da trama.
Os lampejos do bom cinema em Cavalo de Guerra, em sua maioria, estão em meio às cenas de combate
na Primeira Grande Guerra. Empolga a habilidade com que o diretor percorre o
campo de batalha, nos mostrando a brutalidade entre as trincheiras, a clareza
com que entendemos os embates, a facilidade com que nos envolvemos com aqueles
personagens em meio ao limite, o perfeccionismo dos cenários e dos figurinos...
Enfim, Steven Spielberg.
Mas é decepcionante constatar que ele poderia nos oferecer
um épico da pouco registrada guerra de 1914. Recriando seu novo O Resgate do Soldado Ryan sem melodramas
baratos, lições de moral desnecessárias, apenas um relato humanista de um
diretor genial sobre um fato triste da História. O espectador hoje percebe que
a realidade é fantástica por si só, pois como negar tal afirmação quando
descobrimos que, nesta mesma guerra, soldados ingleses e alemães comemoraram
juntos o natal em pleno campo de batalha. E se lá o espírito reconciliador
provém da comemoração do nascimento de Jesus, aqui é a compaixão por um animal
ferido.
Não a toa o Oscar ignorou suas duas obras deste ano,
demonstrando que ele está longe de voltar a velha forma. Spielberg há tempos
não busca se reciclar. Parece-me que sua alma lúdica e desbravadora perdera-se
à deriva em águas conhecidas e pouco desafiadoras.
Verdade... mas mesmo assim gosto muito do Spielberg, sem motivos técnicos. rs
ResponderExcluirO Fanboy do Fábio ainda não se manifestou! rs
ResponderExcluirFora isso, acho que o principal é justamente a questão da renovação.
A parte do combate em si é muito interessante. Sei que é uma ''zona de conforto'' pra ele também, mas gostaria de ver mais filmes dele nesse sentido. Pra quem gosta, a série The Pacific é muito interessante, com produção dele e selo HBO de qualidade!
Daniel, então não deixe de assistir Império do Sol!
ResponderExcluirTodos falam muito bem do Pacific, aliás o Spielberg tem bons resultados como produtor.. acho até que ele produziu mais filmes do que dirigiu.
Valeu a dica!
Na verdade o filme tem seus problemas mas consegue ser divertido!
ResponderExcluirEu não vou defender o filme como defendi antes, já que é notável a falta de cuidado. Mas vou defender que ele tem cenas muito bem filmadas. A cena em que os soldados estão salvando o cavalo é FODA! E se o filme inteiro fosse bom, nós veríamos ela como um ícone, tal como a cena do E.T.
Para terminar, é um filme que paga o seu ingresso do cinema. Valeu muito a pena vê-lo no cinema.
Abraços
A esta hora e acabado de ver no cinema este filme, lamento dizer que a sua crítica, que aceito, vence mas não convence. Digo isto, pois acho que este filme tocou tudo o que acho necessário haver num bom filme. Raramente acontece. Logo que eu puder voltarei para explicar que ver cinema é muito mais do que simplesmente ir ao cinema.Explicarei, no meu ponto de vista a maravilha que o filme tem na sua construção em muitíssimos aspectos. Deixo para hoje a cena da recuperação do cavalo, enfeixado em arame farpado, metáfora de um mundo besta, animal, mas merecedor assim mesmo de atenção. Considero-a, e ainda não fiz a análise total da mesma, como ontológica. Como em breves instantes se resume a filosofia de toda esta narrativa, no salvamento do animal, na aposta e na ridicularização do acto da guerra... Eu diria como as personagens, não vamos iniciar uma guerra...
ResponderExcluirPrometo deixar aqui texto da minha leitura, para que voltem a ver o filme e dessa forma conseguir ver para além da máquina de filmar.
Um abraço!
Dom Joham
E aí cara, blz?
ExcluirSem dúvida esse filme trouxe divergência de opinião. E eu até gostaria de construir uma análise mais completa para o blog, mas realmente me falta tempo.
E concordando com sua afirmação "...conseguir ver para além da máquina de filmar" é que vejo severas falhas nas escolhas fílmicas e narrativas no filme. Posso estar equivocado? Sem dúvida, mas nada melhor do que uma boa discussão. E isso o filme nos proporciona.
Espero seu texto para que possamos prolongar nosso debate e agradeço pelo comentário.
Grande abraço
Tudo em cima.
ExcluirOlha Rodrigo. Sou nascido no rio de Janeiro mas vivo há muito em Portugal. Grato pela recepção. Cheguei por acaso no teu 35, mas logo que der eu vou placar o texto aqui e esperar que você devolva com a tua observação. Gostava de saber o que foram pra você as falhas nas escolhas na narrativa do filme. Posso estar vendo demais, coisas quem nem o Spiel pode lá ter colocado. Compreendo. Tudo bem. Como achei o filme uma análise de um mundo em decadência, um mundo besta, animal, sem ofensa para o animal, com criação em viagem de várias visões analíticas da vida entre os humanos, e entendo que afinal, os animais, apesar de cor diferente, de raça diferente, podendo lutar lado a lado para serem primeiros, nunca deixaram de ser amigos, um preto e um castanho. O mundo humano consegue fazer o mesmo? Essa forma de ver o que acontece na narrativa, de uma luta constante entre dois polos, o esforço pela superação dos obstáculos, as vítimas inocentes (menininha dos morangos - coração), o militar precavido que morre porque o seu chefe autoritário era burro, até o alemão lhe disse isso, a loucura do fuzilamento de duas crianças, entre várias coisas, levam-me a achar a exploração do conceito narrativo deste filme, aliado à sua escolha fotográfica, como sendo de um grande filme de 2011. Olha um final do E TUDO O VENTO LEVOU para colmatar a possibilidade de haver justiça no fim das coisas, como o pai do jovem se achava merecedor. Tem muito para dizer sobre a construção de um filme não naturalista, com esboço da realidade, não sendo um filme de guerra mas tendo a guerra no filme. Logo que tiver um tempo mais para desenhar a escrita prometo dar notícias. Um Abraço. Dom Joham
Dom Joham,
ExcluirComo você, eu também gostei muito do filme. Não extrapolei o roteiro e a filmagem como vocês, mas o filme realmente me tocou. E eu nunca havia deixado o cinema com a essa sensação de êxtase! Eu me emocionei até quando as luzes acenderam e as pessoas bateram palmas.
Abraços!